Brasil registra aumento de 30% dos acidentes de trabalho graves envolvendo crianças

O número de crianças brasileiras de 5 a 13 anos de idade que sofreram acidentes graves enquanto trabalhavam aumentou em 30% entre 2019 e 2020. Os registros no Sistema de Informação de Agravos de Notificação (Sinan), do Ministério da Saúde, saltaram de 83, em 2019, para 108 no ano seguinte. É o pior resultado desde 2007. Os dados são do Observatório da Prevenção e da Erradicação do Trabalho Infantil, desenvolvido conjuntamente pelo Ministério Público do Trabalho (MPT) e pela Organização Internacional do Trabalho (OIT).

De 2012 a 2020 foram registrados 18,8 mil acidentes de trabalho envolvendo adolescentes de 14 a 17 anos de idade com vínculo de emprego regular, segundo levantamento de Comunicações de Acidente do Trabalho (CATs) recebidas pelo INSS. Em média, 1 a cada 5 acidentes envolvendo adolescentes foi ocasionado por veículos de transporte (21% do total), seguido pela operação de máquinas e equipamentos (18%), queda do mesmo nível (13%), mobiliário e acessórios (10%), agente químico (9%), ferramentas manuais (8%), queda de altura (7%), motocicleta (6%), entre outros.

Entre as atividades econômicas que mais causaram acidentes entre adolescentes estão o comércio varejista de mercadorias em geral, com predominância de produtos alimentícios - hipermercados e supermercados (21%), restaurantes e outros estabelecimentos de serviços de alimentação e bebidas (9%) e serviços de assistência social sem alojamento (4%). Durante o mesmo período, 46 adolescentes perderam a vida em decorrência de acidentes laborais.

"O Brasil apresenta um quadro extremamente favorável à explosão do trabalho infantil: retração econômica, elevados índices de desemprego e de informalidade, desproteção social, educação interrompida e ameaças à lei de aprendizagem, cujo público prioritário coincide justamente com a faixa etária de maior incidência do trabalho infantil no país (14 a 17 anos)", observa Ana Maria Villa Real, titular da coordenadoria nacional de Combate à Exploração do Trabalho da Criança e do Adolescente (Coordinfância) do MPT. "É preciso dar concretude à doutrina da proteção integral e ao Estatuto da Criança e do Adolescente, assegurando no plano fático a condição de crianças e adolescentes como sujeitos de direitos e de beneficiários da proteção e assistência especiais", observa.

Atividades insalubres e perigosas

Considerando um período maior, de 2007 a 2020, chega 51,4 mil a soma de registros de acidentes, na faixa etária de 05 a 17 anos, reportados no Sistema de Informação de Agravos de Notificação (SINAN) do Ministério da Saúde. Desse total, 56% (29 mil) dos casos foram acidentes graves, quase todos atingido a faixa etária de 14 a 17 anos. Cerca de mil acidentes graves acometeram crianças até 13 anos de idade e pela legislação brasileira o trabalho é terminantemente proibido nesta faixa etária. A tipologia dos agravos e uma análise mais aprofundada dos registros do SINAN revelam que grande parte das atividades laborais desenvolvidas pelo grupo etária de 14 a 17 anos são insalubres e perigosas e, portanto, também proibidas pela legislação nacional.

"É importante enfatizar que as crianças e adolescentes são extremamente vulneráveis e suscetíveis a acidentes de trabalho em função da menor coordenação motora e visão periférica, inexperiência e limitados níveis de destreza e conhecimento para desempenhar trabalhos que muitas vezes os forçam a manipular instrumentos perfurocortantes e contato/manuseio com produtos tóxicos", destaca o cientista de dados e procurador do MPT Luís Fabiano de Assis, que coordena a plataforma SmartLab de Trabalho Decente. "É exatamente por isso que a legislação nacional proíbe o trabalho em qualquer atividade antes dos 14 anos e estabelece uma série de restrições ao trabalho entre os 14 e os 17 anos de idade", completa.

Tráfico para exploração sexual

O Observatório também traz dados atualizados sobre potenciais locais de risco de aliciamento de crianças e adolescentes para fins de exploração sexual comercial, uma das piores formas de trabalho infantil que também configura tráfico de pessoas.

Com base em dados do Mapeamento dos Pontos Vulneráveis à Exploração Sexual de Crianças e Adolescentes nas Rodovias Federais Brasileiras (MAPEAR), a plataforma SmartLab realizou um inédito detalhamento em nível municipal das áreas de risco de exploração sexual de crianças e adolescentes nas rodovias e estradas federais. No ciclo 2019/2020, houve aumento de 46% no número de localidades de risco (totalizando 3.651 pontos, dos quais 470 são críticos) em relação ao ciclo anterior (2017/2018), que apresentava 2.487 pontos. Entre as Unidades da Federação, os pontos de maior risco foram observados no Paraná (388), Minas Gerais (350), Bahia (325) e Goiás (305).

Com relação aos 470 pontos críticos (aqueles que reúnem maiores fatores de vulnerabilidade em uma rodovia federal), a Bahia abriga a maior quantidade (78), seguida por Goiás (55), Pará (49), Minas Gerais (41) e Ceará (34). Dentre as rodovias federais com a maior representatividade de pontos críticos destacam-se as BRs 116 (17%) e 101 (13%). Postos de combustíveis (com 51% do total) destacam-se como os principais pontos mais vulneráveis, sendo os bares (11%) e casas de massagem, shows, boates ou prostíbulos (7%) os principais logradouros adicionais.

Disque 100

Por intermédio de cooperação com o MMFDH e a Ouvidoria Nacional de Direitos Humanos, o Observatório também passa a apresentar dados do Disque 100. De 2012 a 2019, foram registradas cerca de 54,7 mil denúncias relacionadas ao trabalho infantil. As denúncias mais frequentes são: trabalho infantil doméstico (32% do total); outras atividades proibidas ou ilícitas (32%); trabalho em ruas e logradouros, mendicância e catação de lixo (18%); tráfico de drogas (15%); tráfico de pessoas, inclusive trabalho escravo (5%) e exploração sexual comercial (1%). As Unidades da Federação com maior número de denúncias são: São Paulo (17% do total), Rio de Janeiro (10%), Minas Gerais (9%) e Bahia (8%).

As denúncias do Disque 100 abrangem situações de trabalho extremamente perigosas e proibidas pela legislação brasileira, inclusive por se enquadrarem na lista das piores formas de trabalho infantil. Cerca de um terço das denúncias se refere ao trabalho infantil doméstico. As meninas, meninos e adolescentes que realizam atividades domésticas são "trabalhadores invisíveis", pois o trabalho é realizado no interior de residências que não são as suas, sem nenhum sistema de controle ou proteção e longe de suas famílias.

No Maranhão, por exemplo, o trabalho infantil doméstico responde por 40% das denúncias. Já em Minas Gerais predominam as outras atividades proibidas ou ilícitas (31%) e as denúncias de tráfico de drogas (21%) possuem representatividade de seis pontos percentuais a mais do que a média nacional (15%).

Sobre o Observatório

O Observatório da Prevenção e Erradicação do Trabalho Infantil é um dos cinco observatórios digitais da iniciativa SmartLab de Trabalho Decente, um laboratório multidisciplinar de gestão do conhecimento com foco na promoção do trabalho decente no Brasil.

O Observatório busca fomentar a gestão eficiente e transparente de políticas públicas, de programas e de projetos de prevenção e de erradicação do trabalho infantil, de modo que essas ações sejam cada vez mais orientadas por resultados e baseadas em evidências. Busca-se, além disso, fomentar o aprimoramento dos sistemas de coleta de informações e a padronização com integração dos bancos de dados existentes, de diferentes fontes, relevantes para a causa. Com isso, os diagnósticos e o conhecimento produzidos sobre o tema serão cada vez mais precisos.

Acesse aqui:

Portal SmartLab
Observatório de Segurança e Saúde no Trabalho
Observatório da Prevenção e da Erradicação do Trabalho Infantil
Observatório da Erradicação do Trabalho Escravo e do Tráfico de Pessoas
Observatório da Diversidade e da Igualdade de Oportunidades no Trabalho
Observatório do Trabalho Decente nos Municípios Brasileiros

 

*Com informações da Secretaria de Comunicação da Procuradoria Geral do Trabalho

 

 

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